“Os dados mostram o que nós, periféricos e negros, já conhecemos”

Baby Amorim, produtora e coordenadora de projetos do Ilú Obá De Min, enfatiza desigualdades sociais e o desmonte das políticas públicas culturais, durante evento de lançamento da pesquisa “Viver em São Paulo: Cultura na Cidade”

No dia 9 de abril, foi lançada a pesquisa “Viver em São Paulo: Cultura na Cidade, realizada pela Rede Nossa São Paulo em parceria com o Ibope Inteligência, em evento realizado no Sesc Pompeia.  O evento contou com intervenção artística da Cia Sansacroma e com debate sobre o tema.

Na mesa, Baby Amorim, produtora e coordenadora de projetos do Ilú Obá de Min, declarou: “Os dados mostram o que nós, periféricos e negros, já conhecemos”. Para Amorim, apesar da sociedade compreender “o quanto a cultura é essencial”, politicamente não é “levada a sério”.

“Cultura diz respeito a nós, a nossa sobrevivência, nosso pertencimento à sociedade. Tudo o que está envolvido na construção do humano”, disse Danilo Miranda, diretor regional do Sesc São Paulo. Em relação às políticas públicas, para ele, “não há um plano que garanta continuidade”.

Já o secretário de Cultura da cidade de São Paulo, Alê Youssef, entende que a “cultura está sob ataque” e enfatizou a discussão sobre a Lei Rouanet. Gustavo Soares, do Movimento Cultural Ermelino Matarazzo criticou essa visão: “É estranho ouvir que estamos todos no mesmo barco, não estamos. Estamos há muito tempo denunciando o desmonte na cultura. Isso só ganha dimensão maior quando chega em lugares privilegiados”, explicou.

Também integrante do Movimento Cultural Ermelino Matarazzo, Yasmin Ribeiro, reforçou: “Vocês conhecem alguém da quebrada que já foi contemplada pela Lei Rouanet? Eu não”. Soares entende que “quem transforma de fato a cena cultural na cidade nos últimos anos são os coletivos periféricos”.

Especificamente em relação à capital paulista, o secretário afirma existir “ampla e incisiva cultura de ocupação da cidade com a cultura”, como resultado do “movimento da sociedade civil”.

Youssef destacou, também, o crescimento do carnaval paulistano nos últimos anos e garante que, se não fosse o carnaval, “o índice da pesquisa seria muito diferente” – o estudo aponta que 78% dos entrevistados e entrevistadas frequentaram atividades culturais gratuitas promovidas pela Prefeitura. Ele entende que o carnaval da capital paulista é uma referência e que devemos “carnavalizar as políticas públicas”.

Gustavo Soares chamou a atenção para o fato de gratuidade e proximidade de casa não serem fatores separados para a participação ou não em eventos. A pesquisa aponta que preços mais acessíveis (42%), proximidade de casa (25%) e facilidade de acesso/locomoção (12%) são os principais fatores que fariam com que as pessoas frequentassem mais atividades culturais. “Um evento de graça no Centro Cultural São Paulo custa no mínimo 20 reais para quem mora na zona Leste”, exemplificou.

O estudo revela, também, que 28% das pessoas não frequentaram nenhuma atividade cultural nos últimos doze meses. Neste grupo, o perfil que se destaca é de pessoas menos escolarizadas, com 55 anos ou mais, com renda familiar de até dois salários mínimos, pretos e pardos e moradores da zona Leste.

Já para Gil Douglas, também do Movimento Cultural Ermelino Matarazzo, “a visão [sobre cultura na cidade] não muda. A pesquisa mostra desigualdade, mas a resposta vem pro centro”, observou destacando a proposta do secretário de Cultura, Alê Youssef, de fazer um “sarauzódromo” e promover exposições e slams na Biblioteca Mário de Andrade, localizada na rua da Consolação.

“Os saraus e slams são mais democráticos porque são feitos de nós para nós. Se formos pensar em outras formas de manifestações, pode ser que não tenhamos público. Então precisamos repensar a lógica de trazer a periferia para outros espaços”, explicou Douglas.

Uma ferramenta importante para combater essas desigualdades é regionalização do orçamento da cultura, para Gustavo Soares. “Precisamos da descentralização. Precisamos saber quanto é destinado para cada área da cidade”, afirmou.

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