Corredor de comércio em área residencial divide proprietários

Por Fernanda Mena

O aumento de 13% nos corredores de comércio encravados nos bairros que constituem as Zonas Exclusivamente Residenciais (ZER) e a ampliação da variedade de usos permitidos ali promoveram o conflito mais ruidoso da atual proposta de revisão da Lei de Uso e Ocupação do Solo.

Concentradas no chamado quadrilátero burguês, composto pelos Jardins (Paulistano, Europa e América) e bairros como Alto de Pinheiros e Pacaembu, as ZER concentram boa parte do PIB paulistano, mas também porção generosa do verde que penetra o tecido urbano.

"Esses bairros são paradigmas de planejamento urbano. São organizados e têm associações de moradores antigas e ativas, que não foram consultadas para a criação desses corredores os quais não sabemos a quem serve", diz a arquiteta Lucila Lacreta, do movimento Defenda São Paulo. "Além disso, extinguiram as zonas de transição, que protegiam a ZER."

Zona de transição, como o nome diz, está prevista no Plano diretor mas não foi proposta no novo zoneamento. Serve para amenizar o impacto da transição entre uma zona e outra. Segundo Daniel Montandon, da SMDU, a própria ZCORR fará a função de transição entre zona residencial e mista, onde é possível construir prédios.

Para Renato Cymbalista, professor de história do urbanismo da FAU-USP, a proposta de zoneamento não vai na direção certa quando arrisca submeter as ZER a usos comerciais mais variados.

"São bolsões de verde que regulam a temperatura da cidade e garantem parcela de solo permeável. Se vários imóveis ali virarem agências bancárias, por exemplo, o verde perde lugar para estacionamentos de carros", diz.

Cymbalista defende que, assim como foi feito em cidades como Nova York, Londres e Paris, as grandes casas sejam reformadas internamente para abrigar vários "apartamentos", em um pequeno condomínio, permitindo que mais pessoas morem por ali.

"A cidade toda quer bairros agradáveis. Precisamos garantir que essas áreas sejam preservadas em seu uso residencial, aumentando sua densidade", propõe.

Preservacionistas

Fernando José da Costa, presidente da Ame Jardins, uma das associações mais atuantes nos debates sobre o novo zoneamento, afirma que as chamadas Zonas Corredor (ZCORR), novo tipo de zona que amplia os usos antes permitidos nessas ruas, foram recebidas "com surpresa e preocupação".

"Escolhemos morar em bairros sem comércio e sem grande circulação. Não há ilegalidade nem vergonha em escolher este estilo de vida e alcançá-lo", diz.

O engenheiro Marcos Ferras de Resende, 48, que vive próximo a uma rua traçada como ZCORR, no Jardim Paulistano, avalia que essas ruas vão criar um "efeito de destruição" nesses bairros.

"Elas trarão veículos pesados, barulho e violência para esses bairros. O próximo passo será demarcar mais e mais ZCORR até extinguir a zona residencial."

Segundo o secretário Franco, há pessoas que querem usos mais diversos nessas ruas e outras que querem restringi-los. "É um conflito interno desses moradores."

Para ele, o que gera perda da primazia da função moradia é a cidade como um todo. "O desequilíbrio entre as regiões gera grandes movimentos pendulares que aumentam o trânsito e são o principal motivo da perda de qualidade em certos bairros."

Legalização

Paulo Bizzo, 64, é um desses moradores que pedem a legalização de ruas que, na prática, já são corredores comerciais. Ele é proprietário de uma casa na rua São Benedito, no Alto da Boa Vista.

"Aos poucos, a rua ficou muito movimentada e passou a ter um escritório aqui, um pet shop ali, uma escola de inglês… Quem morava, fugiu", conta ele, que transformou sua casa em uma escola de dança e conseguiu, por meio de uma associação de comerciantes locais, a inclusão da rua como ZCORR.

"Há quem seja contra. Mas não se consegue vender nem alugar os imóveis para uso residencial e fica tudo abandonado. Queremos apenas legalizar a situação."

Para Resende, do Jardim Paulistano, quem está ilegal não deveria ser anistiado. "Precisamos parar com atitudes que premiam aqueles que, muitas vezes, são os que corrompem os fiscais", ataca. "A gente sempre denuncia quem está fora da lei e nada é feito. Quem obedece a lei é que sai prejudicado."

Matéria originalmente publicada no jornal Folha de S. Paulo

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