A cidade nua, em uma foto de corpo inteiro, que revela suas fraquezas e virtudes

Índice de desenvolvimento sustentável mostra onde os municípios podem evoluir

Antes da pandemia, as cidades já eram apontadas como os fiéis na balança do desenvolvimento sustentável, modelo estimulado pela Organização das Nações Unidas (ONU) e que se propõe a enfrentar, até 2030, desafios da humanidade que carregamos há milênios, como a pobreza, ou mais recentes, como o aquecimento global.

Diante da falta de limites que reinou durante décadas, atingimos a exaustão do planeta e a vida, impactada por tantos desequilíbrios, está em risco. O estabelecimento de um compromisso comum entre os países do mundo —a Agenda 2030— é coisa rara na história, foi uma grande conquista e serve de guia orientador para governos, empresas e sociedade civil avançarem na necessária transição de modelo de desenvolvimento.

A pandemia confirmou que os temas ali apontados em 2015 (como o grande contingente da população em situação de pobreza, dificuldades de acesso a serviços de saúde, habitação precária e falta de esgotamento sanitário) penalizam a população mais vulnerável e devem ser enfrentados com urgência para reduzir a desigualdade estruturante das cidades.

A pergunta que surge é: como as cidades podem se enxergar nessa agenda? Quanto cada uma já percorreu deste caminho para 2030? Onde estão seus êxitos e fragilidades?

São perguntas às quais o Índice de Desenvolvimento Sustentável das Cidades (IDSC-BR), lançado na última semana pelo Instituto Cidades Sustentáveis, no âmbito do Programa Cidades Sustentáveis, em parceria com o Sustainable Development Solutions Network (SDSN), busca responder: revelar os dados das cidades e permitir que enxerguem o estágio em que se encontram em cada um dos ODS. Uma fotografia de corpo inteiro da cidade que revela suas cicatrizes e belezas e pode servir para estimular o avanço nos 17 ODS até 2030.

A cidade que obteve a melhor colocação entre os 770 municípios pesquisados foi Morungaba, no interior de São Paulo. Com a pontuação obtida, pode-se dizer que ela já percorreu três quartos do caminho para alcançar a meta de 2030. O índice mostra que o município tem desafios em saúde e educação, e êxitos em energias renováveis e em políticas de resíduos sólidos.

Entre as capitais, Curitiba é a mais bem colocada. Tem bons indicadores nas emissões per capita e em investimento em infraestrutura e outros que deixam a desejar, como na erradicação da fome e na saúde de qualidade.

As 20 cidades mais bem colocadas são do Estado de São Paulo. Se ampliarmos o recorte, percebemos que as cidades das regiões Sudeste e Sul são também as mais bem pontuadas. Aparece, então, a desigualdade entre estados e regiões, que merece um olhar de redistribuição orçamentária visando a um país mais equilibrado.

A análise do índice permitirá que as cidades destinem a melhor energia para enfrentar suas fragilidades, definindo novas prioridades e investimentos. Poderemos, também, monitorar as cidades de determinado bioma, identificando quais características comuns têm as cidades da Amazônia, por exemplo, ou do cerrado, o que permitirá o estímulo a políticas públicas transformadoras. Cidades de mesmo porte poderão ser analisadas e comparadas, gerando referências e estímulos para avançar em determinados ODS.

A partir do diagnóstico, as cidades poderão elaborar um planejamento integrado, definir orçamento, inverter prioridades e levar suas experiências para fóruns nacionais e internacionais.

Uma cidade que caminhe nesta direção será mais resistente a crises de qualquer ordem: sanitária, econômica e climática. Uma cidade com menos pobreza, mais acesso à saúde, mais qualidade na educação, menos desigualdade e menos emissões, será mais resiliente, gerando menos sofrimento e mais qualidade de vida para a população.

A Agenda 2030 prevê, entre outras metas, erradicar a pobreza, reduzir a desigualdade social à metade e caminhar rumo à neutralização das emissões de gases de efeito estufa. Diante dos aprendizados que temos tido na pandemia, nada mais importante do que as cidades assumirem agendas ambiciosas, integradas e que promovam mudanças estruturantes.

Jorge Abrahão
Coordenador geral do Instituto Cidades Sustentáveis, organização realizadora da Rede Nossa São Paulo e do Programa Cidades Sustentáveis.

Conteúdo publicado originalmente no jornal Folha de S.Paulo

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