“Mantega quer adiar regra de segurança em veículos” – Folha de S.Paulo

Equipamentos seriam obrigatórios em todos os carros novos a partir de janeiro
Ministro diz estar preocupado com o impacto no preço dos carros; nova regra era prevista desde 2009

MARIANA SCHREIBER DE BRASÍLIA FELIPE NÓBREGA DE SÃO PAULO

Expressando preocupação com o aumento no preço dos carros, o ministro Guido Mantega (Fazenda) afirmou ontem que o governo deve prorrogar o prazo para a instalação obrigatória de airbags (bolsas que inflam em caso de colisão) e de freios ABS (que evitam o travamento das rodas) em todos os carros novos.

A exigência dos dois itens para 100% da frota nova no próximo ano está prevista desde 2009 em duas resoluções do Contran (Conselho Nacional de Trânsito), formado por representantes de oito ministérios. A Fazenda não faz parte do conselho.

Após a declaração de Mantega, o Ministério das Cidades e o Denatran (Departamento Nacional de Trânsito) disseram em nota que desconhecem mudança no cronograma e que a obrigatoriedade começa a valer em 2014.

A Folha apurou que o governo tratará o assunto diretamente com a Anfavea (associação das montadoras), na semana que vem.

Em vez de elevar para 100% o percentual de carros com os equipamentos, como previsto, Mantega afirmou que poderia haver um aumento gradual. "Nós estamos estudando o que fazer com isso. Possivelmente, nós vamos adiar a entrada em vigor. Provavelmente, nós vamos diferir isso em um ou dois anos."

IMPACTO NA INFLAÇÃO

Na declaração sobre a prorrogação, dada em Brasília durante evento com empresários da indústria, Mantega afirmou estar preocupado com o impacto dos equipamentos no valor dos carros.

"Elevaria o preço entre R$ 1.000 e R$ 1.500", prevê o ministro. A Folha havia antecipado, na terça, que montadoras previam aumentos de até 10% nos modelos populares.

A preocupação com o preço dos veículos faz parte do esforço do governo para tentar conter a inflação.

Pelo terceiro ano seguido, o governo Dilma Rousseff não entregará a inflação no centro da meta de 4,5%, o que servirá de combustível para críticas na campanha eleitoral de 2014.

Hoje, o índice está em 5,77%, e o objetivo do governo é conseguir levá-lo para mais perto do centro da meta no ano que vem. A projeção do mercado, no entanto, é que a inflação permanecerá próxima de 6% em 2014.

Para o Denatran, que tem a responsabilidade de zelar pelo cumprimento da legislação de trânsito, a edição das resoluções estabelecendo o uso obrigatório dos sistemas de segurança a partir de 2014 "foi um passo importante para diminuir os índices de mortalidade e acidentes no trânsito", segundo seu site.

Procurado, o Ministério da Fazenda não comentou a nota do Ministério das Cidades e do Denatran.

Opinião – Nem todos os meios valem para segurar a inflação

VALDO CRUZ DE BRASÍLIA

O que é mais importante, tomar medidas para salvar vidas ou evitar que os preços subam e a inflação fique mais alta? A pergunta parece ser fácil de ser respondida, mas o Ministério da Fazenda emite sinais de que pode optar pela pior resposta.

Explico: o ministro Guido Mantega (Fazenda) anunciou ontem que o governo pode adiar a entrada em vigor, em 2014, da regra que obriga todos os carros novos no Brasil a conter itens básicos de segurança, como air bag frontal duplo e freios ABS.

Buscando justificar a medida, que pode alterar decisão adotada em 2009, Mantega disse: "Estamos preocupados com o impacto disso no carro, eleva o preço em R$ 1.000 a R$ 1.500".

A frase do ministro não poderia ser mais infeliz. Passa a imagem de que o governo está mais preocupado em segurar a inflação e garantir a venda de carros do que em salvar vidas e proteger brasileiros da violência do trânsito.

Claro que não podemos dizer que Mantega pouco se importa com os milhares de acidentes de trânsito que acontecem a cada dia no Brasil. Pelo contrário. Mas sua visão puramente econômica do caso mostra insensibilidade para questão social grave.

O governo vai dizer que não quer revogar a medida, apenas adiar sua entrada em vigor, evitando que dê um salto de 60% (percentual de carros que teriam que se adaptar às novas regras neste ano) para 100% no próximo ano.

Sinceramente, não é justificativa aceitável. A decisão do Conselho Nacional de Trânsito está tomada desde 2009. As montadoras tiveram tempo mais do que suficiente para se adaptar e, tudo indica, o fizeram em sua maioria. O que está falando mais alto é o lado econômico.

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