Sociedade civil quer a revogação do decreto que reduz número de conselheiros participativos

Redução da participação popular nas decisões sobre a cidade e inconsistências na nova regra estabelecida pela Prefeitura foram motivos de críticas em audiência pública.

Por Airton Goes, da Rede Nossa São Paulo

A reivindicação de que a Prefeitura de São Paulo anule o decreto que reduz o número de conselheiros participativos municipais foi defendida pelos paulistanos que lotaram o Auditório Prestes Maia, da Câmara Municipal, na audiência pública sobre as recentes mudanças promovidas pela atual gestão nos conselhos das cidades.

Promovido pela Comissão de Política Urbana do Legislativo Paulistano, com o apoio da Rede Nossa São Paulo, o evento contou com a presença de muitos conselheiros participativos e integrantes de outros conselhos de políticas públicas da capital paulista, além de vereadores e representantes de organizações da sociedade civil.

Durante a audiência, ocorrida na última sexta-feira (1/9), muitas pessoas criticaram o que chamam de “desmonte da política de participação”, que estaria sendo praticada pela gestão do prefeito João Doria. 

“Queremos que a Prefeitura revogue esse decreto e convoque uma conferência com os conselheiros participativos para aperfeiçoar o conselho”, defendeu Maurício Piragino, o Xixo, da Escola de Governo e do Grupo de Trabalho (GT) Democracia Participativa da Rede Nossa São Paulo. Ele lembrou que a criação do Conselho Participativo, ocorrida na gestão municipal anterior, foi resultado de uma luta da sociedade.

Xixo destacou que a participação popular nas decisões sobre as políticas públicas está escrita na Constituição Federal. “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente”, repetiu ele três vezes (texto do parágrafo único, do artigo 1º, da lei maior do país), sendo bastante aplaudido pelos participantes da audiência.   

Para o coordenador-geral da Rede Nossa São Paulo, Jorge Abrahão, a participação é fundamental para se enfrentar os complexos problemas da cidade, incluindo as enormes desigualdades econômicas e sociais. “O que a gente percebe é que a sociedade quer participar e esse fechamento de canais de participação, por parte da Prefeitura, vai contra isso” ponderou.

Ele registrou que a Nossa São Paulo já havia solicitado à Prefeitura a revogação do decreto (que reduz o número de conselheiros participativos). E, para sensibilizar a atual gestão municipal, citou a conclusão de um relatório do Banco Mundial: “as políticas públicas têm muito mais condições de avançar, se houver participação da sociedade”.

Já o represente do Instituto Pólis, Jorge Kayano, apresentou no evento uma avaliação técnica do Decreto 57.829, de 14 de agosto de 2017. Segundo ele, o texto da nova regra estabelecida pela administração Doria contém uma série de inconsistências e erros, que inviabilizam a sua aplicação. 

“Esse decreto deve ser revogado não apenas porque reduz a participação da sociedade, mas porque é um atestado de ignorância crassa”, argumentou. 

As explicações de Kayano, que também integra do GT Democracia Participativa da Rede Nossa São Paulo, demonstram que o próprio texto do decreto é contraditório com a tabela de conselheiros participativos a serem eleitos em cada região da cidade. 

Além disso, segundo ele, a nova regra subverte a representatividade por região, ao definir, por exemplo, 40 conselheiros para a região da Sé (que possui 431 mil habitantes) e apenas 21 para Campo Limpo (que tem 607 mil moradores). Pinheiros e Sapopemba, embora registrem números próximos de habitantes (289 mil e 284 mil, respectivamente), elegeriam quantidades bem diferentes de conselheiros: 20 no primeiro caso e 9 no segundo. Ou seja, a proporção de um conselheiro eleito para cada 30 mil habitantes não é obedecida pela tabela publicada junto com o decreto. 

Outro problema apontado por Kayano é o fato de a Comissão Eleitoral Central ainda não ter sido instalada. “É essa instância que estabelece as regras gerais do processo eleitoral e, portanto, as comissões eleitorais locais que estão sendo eleitas não são válidas, por descumprirem o próprio decreto”, considerou. 

“Certamente, os excelentes técnicos da Prefeitura não foram consultados para a elaboração dessa norma”, avaliou Kayano, antes de sugerir à gestão municipal: “Para não manter o atestado de burrice e não poder cumprir [o decreto], é melhor revogar, esconder”. 

A audiência contou com a participação dos vereadores Eduardo Suplicy, José Police Neto e Antonio Donato, que também defenderam a ampliação da participação da sociedade. Police Neto é autor da emenda que possibilitou a criação do Conselho Participativo Municipal. 

Dezenas de participantes do evento expressaram suas críticas às medidas que estão sendo tomadas pela administração municipal. “Eu fiz campanha para o João Doria e, quando vejo a redução da participação, me sinto decepcionado”, declarou Léo Coutinho, conselheiro participativo da Prefeitura Regional de Pinheiros.

Simone Boacnin, conselheira participativa da Vila Mariana, leu trechos de um documento que foi encaminhado, em nome de todos os integrantes do Conselho Participativo de sua região, ao secretário municipal de Relações Governamentais, Milton Flávio.  

“A Secretaria agiu de forma autoritária e antidemocrática ao impor novas regras, sem ouvir o Conselho, sem debater com o Conselho maneiras para fortalecer e aperfeiçoar sua atuação”, afirma um dos trechos do documento. 

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Veja abaixo outras imagens da audiência pública:


 

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