SP tem 1 lar roubado por hora e maior nº de ataques a residências em 3 anos

Somente no ano passado aconteceram 10.905 crimes desse tipo no Estado, elevação de 8,5% ante o ano anterior.

O empresário Miguel Antonio dos Santos, de 56 anos, de Sorocaba, interior de São Paulo, ainda não se livrou do trauma causado pelo assalto à mão armada que sofreu em sua casa, com a família, em abril de 2016. Um dos filhos tinha acabado de sair com o carro para o trabalho e o portão automático ainda não tinha fechado, quando os dois ladrões entraram. A mulher, a filha e um empregado foram dominados. “Eu dormia no quarto, quando fui acordado com o cano da arma batendo em minha cabeça.”

Os bandidos amarraram Santos e vasculharam a casa, recolhendo R$ 1,2 mil em dinheiro, 4 celulares, relógios, TVs e as joias da família. “O bandido ficava engatilhando o revólver, apontando para a cabeça da minha filha.” Por fim, jogaram tudo sobre a caminhonete de Santos e também levaram o veículo.

A cada hora, pelo menos um lar paulista é invadido. E o número de roubos a residências em 2016 foi o maior em três anos. Só no ano passado aconteceram 10.905 roubos dessa natureza, elevação de 8,5% ante o ano anterior.

Desde 2014, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) analisa o perfil dos roubos no Estado. Naquele ano, os casos contra residências representavam 2,23% do total – hoje chegam a 2,54%. Neste ano, já ocorreram até abril 3.382 roubos – leve desaceleração em relação ao mesmo período de 2016. Mas os dados não incluem registros de furto, quando não há violência ou grave ameaça a pessoas. Um arrombamento de imóvel, por exemplo, pode ser classificado como furto qualificado. Os furtos passaram de 495.334 para 514.820, entre 2015 e o ano passado. 

Vigilância

O que os números mostram é o que empresas especializadas em oferecer sistemas de segurança privada já sentem na prática. E síndicos e vítimas desses assaltos têm redobrado a atenção nas portarias, por exemplo. Paulo – que não quis divulgar o sobrenome – chama de “incidente” o que houve em abril no prédio da zona sul da capital onde é síndico. Um homem se disse hóspede de um morador e teve a passagem liberada. “Ele e um cúmplice entraram em um apartamento e fugiram levando objetos de valor.”

O episódio levou os condôminos a prestarem atenção para a segurança do local. Está marcada para amanhã uma reunião onde serão apresentados os custos para reformas e aprimoramento do sistema de segurança, que ficou em torno de R$ 60 mil. Apesar do crime, o prédio já contava com um sistema reforçado, que inclui reconhecimento por digital dos moradores e um circuito de câmeras cujas gravações são armazenadas automaticamente em nuvem (online). “Mas não havia nenhum tipo de identificação para os ‘caronas’, os não moradores, o que acabou representando a maior vulnerabilidade”, disse. 

Só que a sofisticação dos criminosos não para. Alexandre Judkiewics, diretor nacional de operações do grupo GR, relata ações criminosas que já incluem o monitoramento pelas redes sociais. “Checam se a família está viajando e, a partir daí, conseguem o telefone da portaria, ligando e se passando por algum morador para liberar acesso.”

Segundo Angélica Arbex, gerente de Relacionamento com o Cliente da Lello – que administra cerca de 2,4 mil condomínios –, é comum a atenção ao tema só ganhar força quando os moradores se tornam vítimas. A segurança, diz, tem de ser um “dos principais pilares da convivência” dessas comunidades. E aponta um tripé para explicar o sucesso dos condomínios seguros: síndico preocupado; condôminos obedientes às regras; e equipamentos adequados. “Não adianta pôr 42 câmeras para o porteiro ficar assistindo em uma tela de 14 polegadas.”

Polícia

 A SSP disse que, desde 2016, desarticulou ao menos dez quadrilhas, o que esclareceu 35 casos na capital e na Grande São Paulo. Dentre esses, está a prisão de quatro suspeitos de roubos no Morumbi, no Itaim-Bibi e em Pinheiros. Acrescentou que as Polícias Civil e Militar têm reuniões para identificar a atuação de criminosos.

Sobre as estatísticas, o governo destacou que, nos quatro primeiros meses, caiu a participação de ocorrências a residências ante o total de roubos.

Risco maior

Casos de assaltos a residência que acabam em morte são mais comuns do que se imagina. Segundo estudo do Instituto Sou da Paz, esse é o tipo de roubo mais frequente em que há latrocínios: 1 em cada 255 casos ante, por exemplo, a probabilidade em ocorrências contra estabelecimentos comerciais (1 em cada 655) ou cargas (1 em 11.466).

A comerciante Maria de Lourdes Ferreira, de 56 anos, teve a casa, em Sorocaba, invadida por três ladrões. “Eles me levaram para dentro. Tentei ganhar tempo e levei coronhada. Deram muitos socos no meu marido, achei que iam matar.”

Angélica Arbex, da Lello, diz orientar funcionários para que nunca reajam. “Isso mata mesmo.” Para evitar problemas, os funcionários devem se informar sobre os tipos de roubo. 

Síndico profissional em 11 condomínios paulistanos, Sylvio – que também preferiu não divulgar o sobrenome – elenca os mais comuns, com base na própria experiência e de colegas: 1) invasão por quem se passa por prestador de serviço, como de TV a cabo; 2) mulher que passa mal e é socorrida por homem, que pede ajuda no prédio; 3) jovens que se dizem moradores e são liberados sem checagem; 4) ligação externa para liberar acesso.

Artimanhas

Tocar a campainha e ligar no telefone fixo das casas eram parte do modo como atuava uma quadrilha presa na semana passada pela Divisão de Investigações sobre Crimes contra o Patrimônio, da Polícia Civil. O objetivo dos criminosos era assegurar que não havia moradores no local escolhido para o furto. Foram ao menos sete ocorrências assim na região de Alto de Pinheiros, zona oeste da capital.

Quatro homens foram presos após investigação da polícia. Os agentes chegaram a uma casa na Vila Madalena no momento em que dois suspeitos furtavam objetos de valor; outros dois davam apoio do lado de fora.

“Eles escolhiam bairros onde há casas de alto padrão. Escolhiam pela fachada. Quando alguém atendia a campainha, eles já desistiam”, disse o delegado Ronaldo Sayeg. “Se não atendessem a porta, eles ficavam ligando para ter certeza. Depois, arrombavam portas e grades dos fundos das casas, onde geralmente há maior fragilidade.”

O delegado sugere a adoção da transferência de chamadas do telefone fixo para o celular, configurando o aparelho para realizar a transferência se não houver resposta em casa.

Matéria originalmente publicada no jornal O Estado de S. Paulo

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