Promessa de Doria esbarra em tamanho da guarda municipal de SP

A promessa do prefeito eleito João Doria (PSDB) de ampliar a segurança de São Paulo com o uso da GCM (Guarda Civil Metropolitana) esbarra em um efetivo encolhido, desmotivado e que reclama de sucateamento.

Durante a campanha eleitoral, Doria usou os guardas como base para diferentes apostas, como intensificar a área de cobertura em praças (são 5.000) e escolas (3.500 unidades), além de retirar camelôs das ruas e proteger monumentos de pichadores.

Essas promessas de uma política mais linha-dura somam-se a atribuições fixas da corporação, como apoio a servidores em ações relacionadas a moradores de rua e proteção de áreas ambientais. Especialistas ouvidos pela Folha afirmam que o futuro prefeito deveria ter um plano estratégico para a guarda que estabeleça um foco, e não uma série de prioridades.

O tucano vai encontrar, por exemplo, um efetivo menor do que dispuseram alguns de seus antecessores. A GCM tem 5.899 agentes –em 2008, sob Gilberto Kassab (PSD), eram 6.365. A gestão Fernando Haddad (PT) fez um concurso para 2.000 guardas, mas chamou apenas 500. Doria tem até 2018 para contratar o restante dos aprovados.

O efetivo atual representa um agente para cada 2.041 habitantes. No Rio, por exemplo, a média é de um guarda para cada 867 moradores. Durante a campanha, Doria prometeu aumentar o efetivo da GCM, mas agora, eleito, diz que avaliará primeiro a questão orçamentária.

Para o atual secretário de Segurança Urbana, Benedito Mariano, o ideal para a cidade seria dobrar o tamanho da corporação. "A previsão legal do projeto de reestruturação que foi feito na nossa gestão é que o efetivo chegue a 15 mil", diz Mariano, que atribui o tamanho reduzido a gestões anteriores que não fizeram concursos para a área.

Sob Haddad, a cobertura das escolas foi reduzida a um terço do que era no início do mandato –o efetivo médio na função caiu de 3.063 em 2013 para 1.075 neste ano. O petista focou em áreas críticas do centro, como a cracolândia, onde criou uma inspetoria de agentes especializados em redução de danos.

A maioria dos GCMs está acima dos 40 anos e mostra desmotivação após muitos anos com salário inferior a outras corporações, como a Polícia Militar –o piso dos guardas é de R$ 2.299 e o salário de soldado é de R$ 2.929.

O Sindguardas, que representa a categoria, afirma que a gestão Haddad teve pontos positivos, como o contrato para carros da GCM (hoje mais novos porque são alugados) e a reestruturação do plano de carreira. "Mas os dois maiores problemas hoje são o baixo salário e a falta de efetivo", diz Clovis Pereira, presidente do sindicato.

Agentes ouvidos pela Folha reclamam da falta de treinamento e equipamentos, além de serem "jogados de um programa para outro", conforme o prefeito em exercício.

Em janeiro, sob Doria, devem ser deslocados novamente. Na campanha, por exemplo, ele criticou o uso dos guardas no que chama de "indústria da multa", numa referência aos cerca de 80 GCMs que usavam radares-pistola para autuar motociclistas.

Segundo a gestão Haddad, atualmente nenhum guarda tem mais a função específica de multar, nem mesmo esses de olho nas motos.

Foco

O consultor em segurança José Vicente da Silva, que é coronel da reserva da PM, vê com bons olhos o foco na contenção da desordem urbana. No entanto, de acordo com ele, é preciso mais do que isso. "A guarda do município precisa estar dentro de um projeto estratégico", afirma.

"[A GCM pode atuar em relação a] flanelinhas, pichação, lixo em lugar irregular, botecos sem nenhum alvará e fiscalização. Onde tem desordem, tem crime", diz, citando o exemplo de Nova York, com a conhecida "tolerância zero" na década de 1990.

O consultor Guaracy Mingardi afirma que é preciso priorizar. "O que não pode é tentar fazer tudo. Tem que escolher algumas opções para que sejam bem feitas."

Ele afirma que não é necessário deixar um guarda em cada lugar, e sim fazendo rondas pela cidade. "A GCM tem que dar proteção em algumas escolas, mas não é pra bancar o bedel", disse Mingardi.

Matéria originalmente publicada no jornal O Estado de S. Paulo

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