Velocidade das marginais precisa de um tempinho, diz diretor do MIT

POR RAUL JUSTE LORES – FOLHA DE S. PAULO

Os melhores governos municipais são aqueles que reconhecem boas políticas, não importando de onde elas vêm, diz o libanês Hashim Sarkis, 52, diretor da Faculdade de Arquitetura e Planejamento Urbano do Instituto Tecnológico de Massachusetts, o prestigiado MIT.

Questionado sobre a velocidade permitida nas marginais Tietê e Pinheiros, que terão seus limites ampliados no início da gestão de João Doria (PSDB), ele respondeu que, "antes de julgar" a continuidade da redução da velocidade, precisa se "dar um tempinho para medir o impacto".

O tucano disse que aumentará as máximas nessas pistas –de 70 km/h para 90 km/h na expressa, de 60 km/h para 70 km/h na central e de 50 km/h para 60 km/h na local. Admitiu, porém, manter 50 km/h em alguns trechos.

Em tempos de ativismo digital e com pressões maiores, Sarkis opina que prefeitos "precisam agir muito rápido e ter projetos implementados velozmente". Diz ainda que as cidades mediterrâneas deveriam ser estudadas como modelo urbano.

Ele esteve em São Paulo no mês passado, quando anunciou um projeto conjunto de pesquisas em habitação com a Faculdade de Arquitetura da USP e para participar do ciclo de debates ArqFuturo.

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LIMITES NAS MARGINAIS

Seria importante manter as mudanças implementadas [na gestão Haddad] por um tempinho para se entender e medir o impacto, antes de julgar mantê-las ou acabá-las.

Um problema crucial da política urbana é que políticas tendem a ser associadas com ideologias e governos e acabam sendo trocadas junto com eles. Os melhores governos municipais são aqueles que reconhecem boas políticas, não importando de onde elas vieram, quem as fez.

RESULTADOS RÁPIDOS

Prefeitos hoje precisam responder ao ativismo digital dos cidadãos, em uma escala de mobilização inédita. Mudanças de política levam mais do que os quatro anos habituais de um mandato. Os gestores precisam ser muito mais rápidos. Ter mais projetos implementados que grandes planos. Ações visíveis. Pode soar mais superficial, certamente, mas as pessoas querem obras concretas, menos documentos de intenções.

As rivalidades urbanas também tendem a crescer. Hoje prefeitos disputam sedes de grandes empresas, empregos, investimentos. Inovação é fazer a cidade ser diferente também, atraente.

MODELO MEDITERRÂNEO

A cidade mediterrânea é um modelo de qualidade de vida porque é usada por seus cidadãos, que gostam do ar livre, e o clima conecta. Há uma porosidade entre os espaços internos e externos, o público e o privado, um pulso e um ritmo para quem caminha, uma loja do lado de outra, um lugar para comer, outro para beber, e você vai andando.

Essas cidades são abertas a povos, religiões e diversidade, são portos, têm uma cultura mercantil. Com todas as consequências negativas do materialismo, vejo que o comércio fez diferenças
religiosas e culturais completamente aceitáveis. Nova York, Londres, Hong Kong, cidades globais e mercantilistas, têm essas características também. São abertas.

COPAN ABERTO

É uma forma urbana de algo que pode ser replicado, sim, pelo mundo. Algo que eu senti visitando o Copan aqui em São Paulo. Aquilo é obra de arquiteto, não de planejamento de nenhum governo. Em tempos de migrações em massa, desemprego, recessões, temos que aprender a ser mais abertos ainda. O mundo é cada vez mais uma coisa única. Temos que depender uns dos outros cada vez mais.

PESQUISAS DO MIT

Queremos saber como fazer a construção de moradia ser mais barata, como melhorar o ambiente que cerca as crianças com câncer, como construir em áreas onde terremotos são comuns -e depois dessas tragédias. Como reduzir a quantidade de lixo que produzimos. No MIT, criamos o Centro Norman Leventhal de Urbanismo Avançado para tratar de
problemas da vida real e servir de ponte com prefeitos e governos do mundo. Temos um projeto sobre habitação popular em Bogotá, outro sobre transporte coletivo na Cidade do México. Agora desenvolveremos esse projeto sobre moradia com a FAU-USP.

CARRO E SUBÚRBIO

A geração do milênio gosta da vida na cidade, de estar perto dos amigos 24 horas, mas ela não decide sozinha como as cidades são formatadas. Subúrbios podem se tornar mais densos e mais amigáveis com os pedestres, ter ciclovias, os mais jovens adoram pedalar, usam menos o carro. O ambiente construído ao nosso redor é cada vez mais levado em conta como algo importante para a felicidade. Os mais jovens querem emprego, mas querem um bom lugar para viver.

ENSINO DO URBANISMO

Cada aluno do MIT, já no primeiro ano, tem arraigada a missão de mudar o mundo, de melhorar o mundo. Não vão trabalhar sozinhos, precisam ser interdisciplinares, a solução pode estar em qualquer canto. A tecnologia deve ser usada, temos que pensar e fazer. Somos nerds, gostamos disso. Precisamos medir, usar métodos científicos e descobrir os números antes de tirarmos conclusões.

DESENHAR PEDACINHOS

Arquitetos assumem responsabilidades que muitas vezes não estão no que aprendemos na faculdade. Muito do que se ensina é como desenhar pedacinhos individuais de cidade, quando precisamos mediar códigos que não controlamos. Não estamos em uma torre de marfim. Sem impor ideias, temos que viajar pelo mundo para aprender.

GRANDE BAZAR

Estudei nos EUA e voltei ao Líbano para trabalhar na equipe que projetou o novo "Souk" [grande bazar]. Aprendi com o espanhol Rafael Moneo, o arquiteto encarregado do projeto, a pensar na história, no presente e no futuro, a negociar com autoridades, com incorporadores, com investidores, a pensar no espaço público e nas pessoas que o usariam. Foi um intensivo de aprender a criar consensos.
 

Matéria publicada na Folha de S. Paulo.
 

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