Desigualdades em centros urbanos desafiam garantia dos direitos de crianças e adolescentes

Representantes de oito capitais brasileiras debateram hoje, em São Paulo, experiências e propostas para melhorar as condições de vida de meninas e meninos mais vulneráveis.

Aconteceu nesta terça-feira (14/7), na capital paulista, o Seminário Nacional sobre Redução das Desigualdades Intramunicipais: Rumo à Inclusão de Crianças e Adolescentes em Centros Urbanos, promovido pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e a Prefeitura de São Paulo. O evento fez parte das comemorações pelos 25 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Durante o seminário foi apresentada uma análise realizada pelo UNICEF e o Instituto Paulo Montenegro sobre as desigualdades que afetam a infância e a adolescência, tendo como base dados de oito capitais brasileiras: Belém, Fortaleza, Maceió, Manaus, Rio de Janeiro, Salvador, São Luís e São Paulo. Estas cidades participam da Plataforma dos Centros Urbanos, uma iniciativa do UNICEF, das prefeituras, dos Conselhos Municipais dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes e organizações da sociedade civil. 

“O Brasil avançou muito ao longo dos 25 anos de implementação do Estatuto da Criança e do Adolescente. No entanto, muitos desafios permanecem, porque milhares de meninos e meninas foram deixados para trás no que diz respeito à garantia dos seus direitos. Alguns dos maiores desafios apresentam-se justamente nas grandes cidades”, destacou durante o evento o representante do UNICEF no Brasil, Gary Stahl.

Um dos dados mais impressionantes diz respeito à educação. “Em uma sala de aula com 30 alunos, por exemplo, você terá em média 11 estudantes com mais de dois anos de atraso nos territórios com maior defasagem idade-série no conjunto das oito cidades estudadas. Nos territórios onde a distorção ocorre em menor proporção, serão em média dois alunos atrasados. Isso torna o desafio para professores e estudantes completamente desigual”, explicou Ana Lúcia Lima, diretora executiva do Instituto Paulo Montenegro.

Os dados de homicídios também chamam atenção. Nos territórios com menor incidência de homicídios de crianças, adolescentes e jovens entre 10 e 19 anos a probabilidade de um deles ser vítima de homicídio é praticamente nula. Nos territórios com as piores taxas esta probabilidade salta para 136 a cada 100 mil.

Luciana Phebo, coordenadora da Plataforma dos Centros Urbanos, ressaltou que as desigualdades impactam a cidade como um todo, mas certamente afetam de forma mais dura os meninos e meninas, porque estes estão em uma fase peculiar de desenvolvimento. “Como um menino fica ao estar fora da escola quando ao seu redor quase todos estão estudando? Como é para um adolescente não ter acesso a equipamentos públicos de cultura e lazer no seu bairro, não conseguir circular em uma cidade que promete mil oportunidades para todos? Precisamos encontrar e superar essas desigualdades”.

Durante o seminário, os representantes dos municípios também apresentaram suas iniciativas pela redução de desigualdades e debateram caminhos para o aperfeiçoamento de políticas públicas que priorizem as populações mais vulneráveis.

Participaram do evento os prefeitos de São Paulo, Fernando Haddad, de Belém, Zenaldo Coutinho, de Maceió, Rui Palmeira, e de Salvador, Antônio Carlos Magalhães Neto, além do vice-prefeito do Rio de Janeiro, Adilson Pires. O seminário também contou com a participação do diretor global de Programas do UNICEF, Ted Chaiban, da presidente do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), Maria Alice Setúbal, e do coordenador do Observatório de Favelas, Jailson Souza e Silva, entre outros.

Dados analisados

Alguns dos principais achados da análise feita pelo UNICEF e o Instituto Paulo Montenegro são:

Cobertura de pré-natal: Ao nascer em um território (distrito, subprefeitura, regional etc.) com melhor cobertura de atenção pré-natal um bebê tem quatro vezes mais chance de sua mãe ter feito pelo menos as sete visitas médicas recomendadas quando comparado a um bebê nascido nos territórios com pior cobertura.

Taxa de mortalidade neonatal: Um bebê que nasce nos territórios intramunicipais com maior taxa de mortalidade neonatal tem quase quatro vezes mais risco de morrer antes de completar 28 dias do que aqueles nascidos em territórios com menor taxa de mortalidade neonatal.

Taxa de distorção idade-série no ensino fundamental na rede pública municipal: Das mais de 1,8 milhão de crianças matriculadas no ensino fundamental da rede pública municipal das 8 capitais analisadas, pelo menos 430 mil estão mais de dois anos atrasadas em relação ao ano escolar esperado para sua idade. Isto significa que um quarto dos estudantes de ensino fundamental das escolas públicas municipais está com distorção idade-série.

No grupo de territórios com menor incidência de distorção idade-série, 7% do total dos estudantes estão mais de dois anos atrasados em relação ao esperado. A proporção salta para 37% nos territórios com maior incidência de distorção idade-série.

Gravidez na adolescência: adolescentes e jovens de até 19 anos são mães de 8,1 em cada 100 bebês que nascem nos territórios com baixa incidência de gravidez na adolescência. Esta proporção sobe para 26,4 em 100 nos territórios onde essa incidência é maior.

Homicídios de adolescentes de 10 a 19 anos: Mais de 2 mil adolescentes e jovens nesta faixa etária foram assassinados nas 8 capitais analisadas num período de 12 meses. Enquanto nos territórios com menor incidência de homicídios nessa faixa etária a probabilidade de um deles ser vítima de homicídio é praticamente nula, nos territórios com piores taxas de homicídio entre 10 e 19 anos esta probabilidade salta para 136 a cada 100 mil.

Expostos aos piores índices de violência letal vivem mais de 820 mil adolescentes e jovens. Isto equivale a apenas 18% dos jovens que vivem nessas capitais. Porém, provêm desses mesmos territórios 53% das vítimas de homicídios de 10 a 19 anos.

Sobre a Plataforma dos Centros Urbanos

O objetivo da iniciativa é ajudar a reduzir as desigualdades que existem entre as diferentes regiões de uma cidade, e a assegurar melhor acesso a educação de qualidade, saúde, à proteção e oportunidades de participação a todas as crianças e todos os adolescentes.

A metodologia da Plataforma dos Centros Urbanos prevê:

•    coleta, organização e análise de dados recortados por sub-regiões, bem como por raça/etnia, gênero, condição pessoal, orientação sexual, deficiência etc.;
•    definição de políticas públicas que permitam acelerar o acesso a serviços de qualidade de saúde, educação e proteção nos territórios mais vulneráveis;
•    fortalecimento da cooperação intersetorial;
•    construção de planos com a participação das próprias comunidades;
•    promoção da participação de crianças e adolescentes no processo de planejamento, implementação e avaliação dessas políticas;
•    monitoramento e avaliação permanentes dos resultados.

A Plataforma conta com a aliança estratégica da Fundação Itaú Social e da MSC Cruzeiros, além da parceria do Instituto Paulo Montenegro e do Centro de Promoção da Saúde (Cedaps).

Sobre o UNICEF

O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) promove os direitos e o bem-estar de cada criança em tudo o que faz. Com seus parceiros, trabalha em 190 países e territórios para transformar esse compromisso em ações concretas que beneficiem todas as crianças, em qualquer parte do mundo, concentrando especialmente os nossos esforços para chegar às crianças mais vulneráveis e excluídas.

Leia também:

Pesquisa inédita avaliará qualidade de vida de crianças e adolescentes em São Paulo

Brasil é vice-campeão mundial no assassinato de jovens

 

Compartilhe este artigo