Duas em cada três obras de Haddad na periferia ficam apenas no papel

Por BEATRIZ IZUMINO, FELIPE SOUZA e GIBA BERGAMIM JR. – Folha de S. Paulo   

O vidraceiro José Benedito de Souza, 55, já viu sua casa no Itaim Paulista, na zona leste de SP, ser inundada cinco vezes nos últimos seis anos. A cheia mais recente, em fevereiro, danificou a residência e destruiu móveis, em um prejuízo de R$ 6.000. 

A professora Márcia Araújo de Oliveira, 48, teve que fazer uma peregrinação por hospitais da zona norte atrás de um pediatra na semana passada até conseguir atendimento à neta de quatro anos, que engoliu uma moeda. 

A esperança de Souza é a canalização de um rio vizinho à sua residência. A de Márcia, a chegada do prometido Hospital da Vila Brasilândia. 

Essas duas iniciativas são exemplos de projetos da periferia que empacaram no plano de metas do prefeito Fernando Haddad (PT). 

Levantamento da Folha mostra que, a pouco mais de um ano da eleição municipal, na qual Haddad buscará mais quatro anos de mandato, não saíram do papel duas de cada três obras prometidas pela prefeitura nos extremos da cidade em áreas sociais, de mobilidade e urbanização. 

Das 751 construções e reformas tabuladas no plano de metas, 479 (64%) nem sequer tiveram início, 131 (17%) estão em andamento e outras 141 (19%) já foram concluídas. 

O levantamento considerou as principais empreitadas nas áreas de saúde (construção da Rede Hora Certa e de unidades básicas de atendimento, além de reforma de espaços já existentes); educação (construção de creches, CEUs e escolas infantis); transportes (corredores e terminais de ônibus); obras viárias (pontilhões e pontes); urbanização de favelas e contenção de enchentes. 

Procurada pela reportagem, a prefeitura atribui a lentidão nas obras à falta de repasses pelo governo da presidente Dilma Rousseff (PT). 

O desempenho de Haddad nos extremos da cidade, tradicionalmente alinhados ao PT, tem sido alvo de críticas de opositores, que o acusam de priorizar e dar publicidade a obras em áreas nobres, como a ciclovia na av. Paulista. 

Por outro lado, assim como prefeitos anteriores, o petista apostou em bandeiras não relacionadas a obras, mas que também beneficiam a periferia. Entre elas, estão gratuidade do Bilhete Único a jovens de baixa renda e as modalidades semanal e mensal do cartão de transporte. 

SAÚDE E EDUCAÇÃO 

Em seu discurso de posse, Haddad prometeu prioridade ao enfrentamento da pobreza. "Não é possível viver mais tempo com tanta desigualdade, com tanto descaso, com tantas mazelas", disse em 1º de janeiro de 2013. 

Na ocasião, ele também enfatizou que saúde e educação eram "prioritárias". Agora, a cerca de um ano e meio do fim do mandato, as duas áreas têm mais da metade das obras na periferia ainda no papel (veja quadro ao lado). 

Criação petista na gestão Marta Suplicy (2001-2004), que agora tenta entrar na disputa pela prefeitura pelo PMDB, os CEUs —centros educacionais com biblioteca, quadras e piscina— estão comprometidos sob Haddad. 

De 19 unidades previstas em bairros periféricos, só uma foi concluída. As demais não tiveram obras iniciadas. 

A situação se repete na saúde. Entre as metas, há a construção de 61 novas unidades básicas. Apenas cinco delas foram finalizadas, e uma está em obras. 

OUTRO LADO 

A gestão Fernando Haddad (PT) culpa o governo federal pela lentidão no início de obras na periferia da cidade. 

Em nota, informou que os projetos foram licenciados e licitados, mas dependem de repasses de verbas federais que não foram feitos. 

"Todas estas obras estão previstas no PAC (Plano de Aceleração do Crescimento). Dos R$ 8 bilhões prometidos até agora, a Prefeitura de São Paulo recebeu pouco mais de R$ 230 milhões", diz a nota. 

O Ministério das Cidades, responsável pelas obras do PAC e comandado pelo ex-prefeito paulistano Gilberto Kassab (PSD), rebateu, dizendo que a liberação dos recursos para os projetos realizados em parceria com Estados e municípios só começa a ocorrer após o "efetivo início das intervenções". 

"Os repasses correspondem ao ritmo de execução das obras que, nesses casos, por serem de grande complexidade e em áreas já adensadas, têm perfil de médio e longo prazos", diz trecho da nota. 

De acordo com o governo federal, os projetos já iniciados pela Prefeitura de São Paulo receberam mais de R$ 400 milhões do Ministério das Cidades. 

Segundo o ministério, há na Grande São Paulo 17 operações de urbanização contratadas, que representam um investimento de R$ 4,9 bilhões e beneficiarão quase 170 mil famílias. 

No Estado, 703.615 unidades foram contratadas com investimento de R$ 52,5 bilhões, de acordo com a pasta —destas, 398.876 unidades foram entregues. 

Em relação às obras na área de educação, o MEC (Ministério da Educação) afirma que a construção é atribuição da prefeitura. 

Em manifestação em junho, a pasta disse que cabe ao FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) o acompanhamento dos trabalhos e a liberação dos recursos, que são enviados aos municípios à medida em que as obras avançam. 

Matéria publicada na Folha de S. Paulo.

 

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