Centro histórico de SP perdeu chance de mudanças

Berço de São Paulo, centro histórico perde a oportunidade de se revitalizar para o Mundial

Por Ulisses de Oliveira e Filipe Sansone 

A região central de São Paulo perdeu o bonde da história. A exatos dez dias do início da Copa do Mundo, pouco mudaram os pontos capazes de atrair turistas durante o Mundial. Essa é a conclusão de entidades da capital e dos moradores e trabalhadores do centro histórico. 

Vendida como evento que deixaria um legado de transformação  para a cidade, a percepção de quem vive aqui é que muito pouco foi feito. O DIÁRIO visitou sete dos principais endereços turísticos do Centro. A realidade da Praça da Sé, Estação da Luz, Praça da República, Praça Dom José Gaspar (onde está a Biblioteca Mário de Andrade) e do entorno do Museu Catavento Cultural e Educacional, da Sala São Paulo e do Theatro Municipal convive com os mesmos problemas de sete anos atrás, quando a Copa foi anunciada no país, conforme a Associação Viva o Centro e a Rede Nossa São Paulo.

“Perdemos uma grande oportunidade. O pouco que foi feito já deveria ter sido realizado independentemente do Mundial. Houve uma melhora na sinalização, mas a sujeira, sensação de insegurança, degradação das praças e moradores de rua abandonados seguem”, avaliou o superintendente da Associação Viva o Centro, Marco Antônio Ramos de Almeida.

Para ele, a Copa deveria ter servido de incentivo aos agentes públicos, não somente para a área de investimentos. “Já pensou se os taxistas tivessem tido cursos de idiomas e os seus carros estivessem sinalizados com a língua estrangeira aprendida? É uma questão, inclusive, de educação com o visitante, afinal, o turismo é a área que mais gera dinheiro às grandes metrópoles”, destacou.

Degradação

As principais situações encontradas foram usuários de drogas espalhados pelos entornos, travestis, prostitutas e michês trabalhando próximos a crianças, muitos moradores de rua sem perspectivas, árvores e gramados usados como banheiros e pedintes atrás de dinheiro ou até de um cigarro ou bebida.

Para William Lisboa, da Rede Nossa São Paulo, o principal problema crônico que a cidade enfrenta e que só piorou desde que o Brasil foi anunciado como sede da Copa é o tráfico e o consumo de drogas. “O entorno da Sala São Paulo é o ponto mais crítico, onde centenas de pessoas se concentram para se drogar. Já temos entre 100 e 200 cracolândias em São Paulo. Não só os turistas, mas quem vive aqui também encara essa realidade triste com dificuldade.”

‘Uso de drogas é problema social’, diz polícia

Sobre os problemas apresentados pela reportagem, Secretaria de Segurança Pública informou que foi criado o Comando de Policiamento Copa (CPCopa), formado por 4.265 policiais, com três Batalhões de Policiamento Copa.  “A Polícia Militar empregará também as suas unidades de policiamento territorial, unidades especializadas, como Comando de Policiamento de Choque, de Trânsito, Rodoviária e do Corpo de Bombeiros. Serão pelo menos 10 mil policiais militares envolvidos com o evento. 

A pasta também diz que “o problema do usuário de drogas é mais um problema social de caráter multidisciplinar, de saúde pública, que de repressão policial” e as polícias estão atentas no combate ao tráfico. Por sua vez, a Prefeitura diz estar acolhendo e reintegrando os dependentes químicos e moradores  de rua. No âmbito da saúde, equipes do programa “Consultório na Rua” vêm abordando os dependentes nos locais citados para avaliá-los e encaminhá-los às unidades de saúde. Com relação aos moradores de rua, a administração afirmou que atua diariamente em todas as regiões da cidade realizando abordagens e encaminhamentos. São oferecidos encaminhamentos para a rede socioassistencial como um dos 64 centros de acolhida que disponibilizam 11 mil vagas. “ A adesão aos serviços é voluntária, porém, o trabalho é permanente e sempre com a missão de convencê-los a deixarem as ruas”, disse o município.

Teatro Municipal

Mendigos dividem espaço com os artistas de rua. O prédio recém-reformado apresentava sujeira ao redor, como jornais, garrafas de pinga e maços de cigarro. “No horário comercial é ok. Mas experimenta vir aqui após às 18. Polícia só tem quando há manifestação”, opinou a bancária Nayra Boccanera, 25 anos.

Praça da República

As casas de apoio aos zeladores estão pichadas e mal conservadas. O coreto está abandonado e foi ocupado pelos moradores de rua. Travestis e garotos de programa atuam livremente. O policiamento está presente. “É bonita, mas é preciso melhorar o visual”, disse o turista peruano Juan de La Cruz, 25 anos.

Praça Dom José Gaspar

O local, onde fica a Biblioteca Mário de Andrade, é limpo e policiado. Mas mesmo com a presença da PM, um casal foi visto fumando maconha. “Durante o dia é tranquilo, mas não passo aqui à noite. Há muitos trombadinhas e usuários de drogas”, disse o produtor de eventos Eduardo Lima, 30 anos.

Estação da Luz

Prostitutas fazem ponto dentro da estação da CPTM, que tem em seus arredores lixo acumulado. No Parque da Luz, em frente à estação, há muitos moradores de rua que, inclusive, dominaram o coreto onde antigamente se apresentavam bandas. Também há garotas de programa dentro do parque

Catavento Cultural

O museu fica no Parque Dom Pedro II, na Zona Cerealista. Para chegar do Metrô até lá é preciso passar ao lado de um viaduto na Avenida Rangel Pestana, onde se concentram moradores de rua e usuários de crack. O cheiro de urina beira o insuportável. Moradores recomendam carro para evitar problemas

Praça da Sé

No local, há inúmeros moradores de rua que, inclusive, utilizam a água de um lago artificial para beber e se lavar. Pastores delimitam com uma fita adesiva uma área na praça onde pregam para os pedestres que passam por ali. O turista encontra uma das laterais da Catedral da Sé pichada.

Sala São Paulo

O edifício da Sala São Paulo é cercado pela Cracolândia. A Guarda Civil metropolitana “cercou” os viciados para que eles não chegassem à Praça Julho Prestes, ao lado da Sala São Paulo. Mesmo assim, viciados utilizam a droga livremente na praça e pedem dinheiro ou mesmo um cigarro.

Matéria originalmente publicada no jornal Diário de S. Paulo

Compartilhe este artigo