“Nas cidades, decisões têm de ser acordadas” – O Estado de S.Paulo

Roberta Pennafort
 
Serão necessários mais 10 ou 15 anos para Medellín, cidade colombiana que nos anos 1980 e 1990 carregou o desonroso título de mais violenta do mundo, concluir o ciclo de transformação urbana e social por que vem passando na última década – que serve de inspiração para o Rio. Aqui, como lá, tudo depende da continuidade das politicas públicas voltadas à inclusão dos mais pobres, diz o arquiteto Alejandro Echeverri. No Rio para participar do seminário Arq. Futuro – iniciado ontem (23), com continuidade em São Paulo de amanhã (25) a sexta-feira (27), ele fala das lições que Medellín pode dar ao Brasil.
 
O modelo de Meddelín inspirou o Rio. É possível reproduzir seus resultados?
Implementar modelos tendo experiências de outras cidades como referência não é tão fácil. Quando começamos, um dos casos que nos interessou muito foi o do projeto carioca Favela-Bairro (de urbanização de favelas, da década de 1990). Da mesma forma, vieram outros governos a Medellín para reproduzir o nosso. Infelizmente – não estou dizendo que é o caso do Rio -, às vezes pegam só as iniciativas mais visíveis, mas não todos os processos que garantem a permanência e o impacto social do programa.
 
Qual a importância de se levar arquitetura de vanguarda a comunidades pobres?
Mais do que arquitetura de vanguarda, tem de levar boa arquitetura. Medellín ainda está no início do processo, serão necessários mais 10 ou 15 anos, nada estará garantido. O que fizemos foi incluir a comunidade nos processos culturais, econômicos e sociais da cidade "normal". A estética, a atualidade, o design das obras, isso é fundamental para gerar apropriação, valorização e respeito, para que os edifícios sejam pontos de atração para toda a cidade, e não só para as comunidades em que estão.
 
Na Rocinha, o governo queria instalar um teleférico, mas para a população a prioridade deveria ser saneamento básico. Existe um limite para a participação popular?
As decisões têm de ser acordadas, mas nem todas podem ser objetos de participação popular. Há questões estratégicas, como de transporte, que vão implicar mudanças (…) e necessidade de remoções de famílias. Algumas das obras que hoje têm mais êxito em Medellín, como a Biblioteca Espanha, tiveram a princípio muita resistência, porque a população não entendia quais seriam os benefícios -120 famílias foram removidas. A biblioteca virou um projeto emblemático, um marco de participação comunitária. Um sucesso.
 
Um slogan da sua passagem pela prefeitura de Medellín foi planejar para não improvisar". Como isso é possível em áreas marcadas pela informalidade?
Combinamos planejamento e execução de projetos. Mão é possível ser absolutamente teórico. Os projetos-modelo ajudaram muito. Para fazer mudanças nas comunidades, é difícil explicar apenas de forma abstrata, mostrando desenhos: é preciso apresentar modelos reais de transformação.
 
O combate ao crime tem de vir com as intervenções urbanas?
Claro que a violência do narcotráfico não se soluciona unicamente com intervenções urbanas. Na Colômbia, o governo federal focou em segurança e a prefeitura, na reconquista dos espaços públicos. Ainda temos problemas de segurança, e esse processo é frágil, porque a política é frágil.
 
QUEM É
O arquiteto atuou de 2005 a 2008 como secretário de Desenvolvimento Urbano de Medellín. Desde 1995, se dedica a pensar a integração social por meio da construção de bibliotecas, escolas, parques e centros culturais.
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