“Crianças ainda esperam vagas” – Jornal da Tarde

 

Um mês depois do início das aulas, Prefeitura e Estado não deram conta de todas as solicitações

Fábio Mazzitelli, fabio.mazzitelli@grupoestado.com.br

Quase um mês após o início das aulas na rede pública da capital, Prefeitura e Estado ainda não conseguiram acomodar todas as crianças que pedem vaga no ensino fundamental, etapa em que a matrícula é obrigatória e garantida pela Constituição. Em alguns casos, a família ficou mais de três meses à espera da vaga. Os governos negam o déficit, mas admitem falhas no sistema de matrículas compartilhadas entre as redes.

Além de direito constitucional, a Lei de Diretrizes e Bases da educação prevê a possibilidade de as autoridades competentes responderem por crime de responsabilidade se as matrículas das crianças não forem feitas. As aulas na Prefeitura começaram em 8 de fevereiro e no Estado, no dia 18.

“Até por isso é muito improvável que (a criança) fique sem vaga. Perder uma semana de aula que seja já é grave e passível de pedido de indenização pelo dano educacional”, afirma a advogada Ester Rizzi, da ONG Ação Educativa.

Daphne Andrade dos Santos, de 8 anos, está na 3ª série, atual 4º ano, e até ontem aguardava vaga na capital – sua matrícula só foi confirmada ontem após o contato do Jornal da Tarde com os governos estadual e municipal.

Ex-moradora de Franco da Rocha, Grande São Paulo, a família de Daphne se mudou para o Jaraguá, zona norte, e iniciou em novembro o contato para a matrícula na escola municipal Pirituba I.

Apesar de os pais seguirem as orientações do colégio, e de a diretora ter feito promessa de matrícula para “depois do carnaval”, não houve retorno até ontem. O pai da criança, o técnico de informática Marcos André dos Santos, 32 anos, protocolou então pedido de matrícula no Ministério Público em 25 de fevereiro. “Prestes a ter bebê, ela ficava no telefone porque o pessoal não dava uma resposta”, conta Santos.

Enquanto ficou sem escola, Daphne passou os dias brincando no condomínio, ajudou mãe a cuidar da irmã recém-nascida e leu histórias em quadrinhos. A mochila rosa nova, um presente da tia, já está com o caderno novo, em branco. “Quero ir para escola o mais rápido possível”, diz Daphne, a melhor aluna da turma no ano passado, segundo os pais.

Com a demora, os pais cogitaram até mesmo pagar um colégio particular. “Se não estivesse com a dívida da casa, já estaria pagando”, diz o pai.

Promotor da Infância que recebeu o pedido de Daphne, Francismar Lamenza relata que cerca de 20% dos pedidos de vagas que recebe são relativas ao ensino fundamental – o restante é creche. “São uns 2 a 3 pedidos por dia”, diz.

Na zona sul, situação parecida viveu Iohana Aparecida Santana, 14 anos. Ela saiu de Embu para viver com a avó em Americanópolis. Está na 8ª série (9º ano). “Desde outubro, fui a seis escolas, estaduais e municipais, e nada”, diz a avó Maria Flora Oliveira Santana, 52, que procurou a Defensoria Pública. Ela também conseguiu a vaga apenas ontem.

Segundo o defensor Flávio Frasseto, os problemas para acomodação da demanda no fundamental ocorrem desde 2009. “Dizem que é pontual, mas não é bem assim. É desrespeito. Tem que arrumar vaga antes de iniciar o ano letivo”.

DIREITO À EDUCAÇÃO

A partir dos 6 anos, quando começa o ensino fundamental, a família tem a obrigação de matricular a criança e o Estado tem o dever de acolhê-la na escola. Toda criança tem direito à educação

Na capital paulista, as vagas no fundamental são divididas entre Estado e Prefeitura. Para dimensionar a demanda e planejar a rede pública, a matrícula é unificada e feita no segundo semestre, mas a qualquer momento a família pode pleitear vaga em escola pública.

Para casos emergenciais de criança que ainda aguarda vaga na rede da capital, a Secretaria Estadual da Educação pede que as famílias entrem em contato pelo telefone 0800 77 000 12 ou pelo e-mail infoeducacao@educacao.sp.gov.br. A partir do contato, a promessa é de vaga em até 48 horas

Se o problema persistir, os pais podem acionar as ouvidorias do Estado (www.ouvidoria.sp.gov.br) ou da Prefeitura (0800 17 5717), ou ainda procurar o Ministério
Público Estadual ou a Defensoria Pública do Estado 

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