Dez distritos concentram 31% das mortes cometidas por policiais em SP

Segundo estudo da ONG Sou da Paz, Itaim Paulista, é o recordista. Bairros como Aclimação e Consolação não registraram mortes.

Cíntia Acayaba, do G1

Apenas dez dos 93 distritos policiais da capital paulista reúnem 31% das mortes decorrentes de intervenção praticadas por policiais fora ou em serviço nos primeiros semestres de 2015 e 2016, segundo estudo da ONG Sou da Paz.  No total, 211 pessoas foram mortas por policiais militares e civis no 1º semestre de 2016 na cidade de São Paulo.

Como o G1 revelou em agosto, no primeiro semestre de 2016, policiais de folga mataram o maior número de pessoas dos últimos 11 anos no estado de São Paulo se comparado com os primeiros seis meses dos anos anteriores.

De acordo com o estudo, o 50º Distrito, no Itaim Paulista, no extremo da Zona Leste, registrou nove mortes causadas por policiais nos primeiros seis meses desse ano, número 28,6% maior do que no primeiro semestre de 2015, quando registrou sete mortes e também liderou o ranking. 

O 73º DP do Jaçanã, e o 74º no Jaraguá, ambos na Zona Norte, e o 37º DP, Campo Limpo, na Zona Sul ocupam o segundo lugar com sete mortes causadas por policiais cada um. Completam a lista o 47º DP do Capão Redondo, o 49º DP de São Mateus, o 75º DP Jardim Arpoador, o 92º DP Parque Santo Antônio, o 34º DP na Vila Sônia e o 63º DP na Vila Jacuí.

Desses dez distritos, seis também integram o ranking dos dez com o maior número de homicídios dolosos na capital.

Para Stephanie Morin, coordenadora da área de Gestão do Conhecimento do Instituto Sou da Paz, moradores desses distritos estão mais vulneráveis aos homicídios. "Um tiroteio interminável", diz.

"Precisamos entender essa concentração [de mortes]. É preciso de ainda mais transparência para saber mais sobre essas mortes. Inclusive essa distribuição geográfica", disse.

Bairros como Aclimação e Consolação, na região central da cidade, não registraram nenhuma morte por intervenção policial nos primeiros semestres de 2015 e 2016.

O estudo revela ainda que se comparados os resultados dos primeiros semestres de 2015 e 2016, em 38 distritos policiais houve aumento do número de mortes decorrentes de intervenção policial no primeiro semestre de 2016, e redução em 31 distritos.

A Secretaria da Segurança Pública afirmou, por meio de nota, que todos os "casos de Mortes Decorrentes de Oposição à Intervenção Policial (MDIP) são investigados por meio de inquérito para apurar se a atuação do policial foi realmente legítima".

"A atuação da polícia de São Paulo se dá estritamente dentro dos limites da lei. As exceções são apuradas com rigor e terminam com a punição dos policiais acusados de crimes", diz a nota.

"Uma das ações implementada por São Paulo foi a Resolução SSP 40/15, que resultou na queda de 11,4% da letalidade policial Civil e Militar, seja em folga ou em serviço, no primeiros sete meses de 2016 comparado com o mesmo período de 2015. A medida garante maior eficácia nas investigações de mortes, pois determina o inédito comparecimento das Corregedorias e dos Comandantes da região, além de equipe específica do IML e IC, para melhor preservação do local dos fatos e eficiência inicial das investigações", diz o texto.

A Secretaria não respondeu por que os distritos mencionados concentram mais mortes.

Folga

No primeiro semestre de 2016, policiais de folga mataram o maior número de pessoas dos últimos 11 anos no estado de São Paulo se comparado com os primeiros seis meses dos anos anteriores.

Dados oficiais da Secretaria da Segurança Pública (SSP) compilados pelo G1 e por Samira Bueno, diretora executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mostram que policiais militares e civis mataram 115 pessoas nos primeiros seis meses desse ano, 2,5 vezes mais do que no mesmo período em 2006, quando 47 foram mortos e quando ocorreram os crimes de maio após os ataques da facção que age dentro e fora dos presídios.

Para Stephanie, o policial de sente mais vulnerável. "Ele sente que pode ser executado, tem mais medo, ou está treinadao para ter um certo tipo de atuação", disse.

Essas mortes são consideradas como reações ou oposições à intervenção policial e não entram na estatística de homicídio. O recorte foi feito a partir de 2006 porque é quando a categoria "reações" foi criada.

Segundo a Secretaria, "as mortes decorrentes de intervenção policial em folga ocorrem, em sua maioria, a partir da ação de PMs para impedir roubos, seja ele mesmo a vítima ou um terceiro. Em 2015, 60,2% das ocorrências de morte decorrente de oposição à intervenção policial tiveram como origem o crime de roubo, fato que se repete em 2016, com 54,4%", diz nota.

O levantamento foi feito a partir de metodologia usada pela própria secretaria. Até março de 2015, o número era divulgado somente no Diário Oficial como “homicídio doloso fora de serviço reações”. Desde abril do ano passado, no entanto, passou a aparecer nas estatísticas trimestrais publicadas no site da SSP como “pessoas mortas por policiais militares de folga”.

Após o G1 publicar em abril que “Uma em cada 4 pessoas assassinadas em SP foi morta pela PM”, a pasta reconheceu que é correta a comparação entre os dados de "homicídio doloso – fora de serviço (reações)" e "morte decorrente de intervenção policial em folga".

No mesmo período, em 2006, 61 policiais de folga foram mortos nos primeiros seis meses. Em 2016, foram 37 agentes mortos, 32% do total de pessoas mortas por policiais.

Para a diretora executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Samira Bueno, as estatísticas já fazem um "julgamento moral" porque desde o início não consideram que houve um homicídio, mas uma intervenção por legítima defesa. “Antes do inquérito ser concluído, já se assume que o policial é inocente. E o pior, a maioria dos inquéritos é arquivado e os casos dificilmente serão investigados. A série mostra que os policiais se sentem mais impunes, têm carta branca”, disse.

Feridos

O levantamento também mostra aumento no número de pessoas feridas por policiais militares e civis durante o trabalho e nas folgas.

Se levar em conta os dados de feridos por integrantes das duas polícias durante suas folgas, esse número mais do que dobra, indo de 60 no ano passado para 143 em 2016. O número de feridos em confrontos com agentes da PM e da Polícia Civil durante o serviço saltou de 234 no primeiro semestre de 2015 para 259 no mesmo período deste ano.

Matéria publicada no portal G1.
 

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