Com aval para shows, Câmara de SP aprova concessão do Pacaembu

Projeto que prevê a concessão do estádio por até 35 anos recebeu 42 votos a favor e é o primeiro do plano de desestatização da gestão Doria a passar pelo Legislativo

Fabio Leite, O Estado de S. Paulo

A Câmara Municipal de São Paulo aprovou nesta quarta-feira, 30, a concessão do Estádio do Pacaembu à iniciativa privada por até 35 anos. Com 42 votos a favor, o projeto é o primeiro de um amplo plano de desestatizações da gestão João Doria (PSDB) a passar pelo Legislativo e permite a realização de shows no local, o que é alvo de disputa na Justiça. A previsão é lançar a licitação até o fim deste ano.

Apenas 11 vereadores da oposição (PT e PSOL) e Celso Jatene (PR), que foi secretário de Esportes na gestão do ex-prefeito Fernando Haddad (PT) e tentou aprovar outra proposta de concessão, votaram contra o projeto, que passa para a iniciativa privada a gestão de todo o complexo do Pacaembu, incluindo estádio, piscina e quadras poliesportivas, que custa R$ 9 milhões por ano para a Prefeitura. Apenas o Museu do Futebol ficou de fora.

A aprovação folgada contou com o apoio bloco chamado de G-18, grupo de parlamentares que negocia cada projeto com o governo e conseguiu incluir no texto aprovado o prazo máximo de 35 anos de concessão (o texto original não definia prazo), estudo de impacto no bairro, exigência de aprovação prévia dos órgãos de proteção ao patrimônio, uma vez que o Pacaembu é tombado, e a manutenção das gratuidades existentes para quem frequenta o clube atualmente.

"Fizemos uma reunião com todos os líderes da base do governo e incorporamos as principais sugestões. Essa votação com quórum extremamente alto demonstra que construímos um projeto consistente com muito diálogo", disse o líder da gestão Doria na Câmara, Aurélio Nomura (PSDB). 

"Garantimos o interesse público na concessão do Pacaembu. Presevamos integralmente o tombamento, e capturaremos investimentos para qualificação urbanística. O bucólico bairro do Pacaembu está protegido e São Paulo ganha uma lei moderna", disse Police Neto (PSD), um dos líderes do G-18.

Já a oposição acusa Doria de "atropelar" o processo ao aprovar o projeto antes de definir como será feita a concessão e o que de fato poderá ser feito no complexo. "O governo Doria começa pelo fim. Aprova um processo absolutamente genérico antes de ter os devidos estudos e a aprovação do Compresp. A Câmara deu um cheque em branco para o prefeito", disse o líder do PT, Antonio Donato. 

Shows

A principal modificação, porém, foi a inclusão da possibilidade de o futuro concessionário do Pacaembu arrecadar dinheiro com a realização de eventos culturais e de entretenimento, como shows musicais de menor porte, que respeitem os limites de ruído. A realização de shows no estádio é alvo de uma disputa na Justiça entre a Prefeitura e a associação de moradores Viva Pacaembu há mais de dez anos.  

A medida, que foi encampada no substitutivo apresentado por Aurélio Nomura (PSDB), contradiz o discurso público do prefeito sobre a concessão do Pacaembu. Em junho, após a aprovação do projeto original em primeira votação, Doria afirmou que o complexo "continuará a ser utilizado exclusivamente para práticas esportivas".

A versão inicial do projeto não detalhava quais seriam os usos possíveis do Pacaembu, mas a Secretaria Municipal de Desestatização, responsável pelos projetos de privatização e concessão da Prefeitura, já havia informado aos interessados nos estudos envolvendo o estádio sobre a possibilidade de realizar shows "dentro dos padrões de segurança, sossego e saúde legalmente previstos".

Vista como essencial para atrair empresas interessadas em assumir a gestão do Pacaembu, a realização de eventos não esportivos no estádio está baseada, segundo a gestão Doria, em um acórdão do Tribunal de Justiça publicado em junho de 2014, em uma ação judicial movida pela associação de moradores Viva Pacaembu, que é contra a realização de shows por causa dos transtornos provocados no bairro.

A decisão da 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente definiu que "após o julgamento final da ação principal, é possível que os eventos possam ser realizados devendo ser fiscalizados" e "se os ruídos estiverem dentro do estabelecido nas normas ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas)". O limite máximo de ruído permitido em uma residência é de 45 decibéis dentro do dormitório.

Em julho deste ano, a pedido do secretário municipal de Desestatização, Wilson Poit, um procurador-geral da Município, Ricardo Ferrari Nogueira, emitiu um parecer técnico sobre as restrições impostas ao Pacaembu dizendo que a decisão judicial "possibilita a realização de eventos desde que o ruído esteja condizente com os níveis definidos pelas normas da ABNT".

"A determinação do prefeito é que (a concessão do Pacaembu) atenda o acordo judicial e com a vizinhança. O Pacaembu não será aberto para shows (de grande porte). Pelas restrições impostas na decisão judicial, por causa do ruído e do horário, nenhum show se encaixa ali. Agora, eventos culturais e de entretenimento já podem acontecer mesmo hoje", disse Poit.

Em nota, a assessoria de Doria afirmou que o projeto de concessão "prevê que o estádio continuará tendo as mesmas regras de uso existentes hoje, em obediência ao termo de ajustamento de conduta celebrado com o Ministério Público e ao acórdão do Tribunal de Justiça". Segundo a nota, "não há contradição com as declarações do prefeito João Doria, uma vez que este era o espírito do que ele disse (em junho)".

Para a Viva Pacaembu, porém, como a ação principal ainda está em julgamento, agora no Superior Tribunal de Justiça (STJ), ainda vale uma liminar obtida numa medida cautelar de 2006 que proíbe a realização de shows musicais no estádio e na praça Charles Miller.

"Entendemos que o Tribunal de Justiça de São Paulo compartilha do entendimento de que continua em vigor a proibição da realização de shows musicais no Estado e na Praça até o julgamento final da ação principal", afirma Iênidis Benfati, presidente do conselho deliberativo da Viva Pacaembu.

Projetos

Cinco projetos para o Pacaembu já foram apresentados por consórcios formados por empresas privadas e estão sob análise dos órgãos de proteção ao patrimônio municipal, Conpresp, e estadual, Condephat. A maioria das propostas prevê o uso do estádio e ou de prédios que serão construídos dentro do complexto para a realização de eventos culturais e entretenimento.

Os órgãos de proteção ao patrimônio vão apontar o que poderá ou não ser feito. O Estado apurou propostas que prevêm a demolição do tobogã para a construção de um espaço cultural, de restaurantes e até de quartos de hotel devem ser autorizados para seguir adiante, assim como a cobertura de parte do estádio. 

Matéria publicada no jornal O Estado de S. Paulo.
 

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